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O Português como matéria


Veja o que tem Manuel Bandeira a declarar:

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros.
Vinha da boca do povo na língua errada do povo.
Língua certa do povo,
porque ele é que fala gostoso o português do Brasil,
ao passo que nós,
o que fazemos,
é macaquear
a sintaxe lusíada.

O poema está certo. Afinal, que diferença vai fazer na minha vida saber se uma oração é subordinada substantiva subjetiva ou S. S. O. D. se eu souber diferenciá-las corretamente pela prática? Não fazem isso no inglês, por exemplo. Só perguntam qual a forma correta de escrever e falar sem que julguemos sintaxes ou morfologias, enquanto o Português se torna mais uma matéria a valorizar desnecessariamente o decorar: de cinco escores, dão um pela grafia correta e quatro pra explicação do item.

Discordo, porém, de Manuel Bandeira, ao achar que o Português mais bonito não se aprende com a prática. Não só por causa dos “a gente somos” nem pelos “foi eu” cantados nas ruas, mas porque até os grandes gramáticos se contradizem. Mesmo nós dois, “bons fluentes”, temos lá nossas dúvidas! que às vezes nem meu pai, muito mais vivido que eu, sabe tirar. Isso justifica, em parte, a quantidade de escores destinados à explicação da forma correta da Língua, mas não é suficiente para desvalorizar tanto sua parte deduzível.

O inglês sim: se aprende viajando, assistindo a filmes... Nunca vi ninguém aprendê-lo no colégio. Não é a toa que é a mesma matéria desde a quinta série: ou você sabe ou não sabe!

Então deve-se maneirar! A gente não aprende Português na escola. Por que ela quer nos ensinar? O certo seria apenas polir, esclarecer as dúvidas. Só. Tudo virou simplesmente complicado.
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Filosofia de Friedich Nietzsche

Uma das passagens que valeram a leitura do livro. Não dá pra dizer que concordo com todas as citações de Nietzsche, mas, certas ideias, como esta, são indiscutíveis e muito bem colocadas pelo professor. Vejamos:

Ah! Existe uma importante distinção entre nós. Eu não alego que filosofo para si, enquanto o senhor, doutor, continua fingindo que sua motivação é servir-me, aliviar minha dor. Tais alegações nada têm a ver com a motivação humana. Elas fazem parte da mentalidade de escravo engendrada com astúcia pela propaganda sacerdotal. Disseque suas motivações mais profundamente! Achará que jamais alguém fez algo totalmente para os outros. Todas as ações são autodirigidas, todo serviço é autosserviço, todo amor é amor-próprio. Parece surpreso com esse comentário? Talvez esteja pensando naqueles que ama. Cave mais profundo e descobrirá que não ama a eles: ama, isso sim, as sensações agradáveis que tal amor produz em você! Ama o desejo, não o desejado. Assim, permita que pergunte de novo por que deseja servir-me.

(YALOM, Irvin D.. "Quando Nietzsche chorou", Rio de Janeiro: Agir, 2009. P. 138)
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O paradoxo da internet

Quantos amigos de verdade você tem? No meu caso podem ser contados nos dedos, mas nunca fiz um amigo pela internet. Acho que é porque a rede social desobriga a gente a se conhecer direito. No mundo virtual, as pessoas têm centenas e milhares, o que leva a uma superficialidade nos relacionamentos. Daí o sucesso do Twitter, onde poucos sentem a necessidade de dar mais de 140 tecladas. Afinal, na era da velocidade, a globalização diz: “Você não vai querer perder tanto do seu precioso tempo com essa pessoa!”.

Bem, pode-se perceber que um dos maiores sinais do amar é o gastar tempo (com essa pessoa, coisa...), justamente o oposto do que é pregado pela atual sociedade. Nela, o amor não é necessário ao sucesso do homem; pelo contrário, pode, muitas vezes, cegá-lo. Seria impossível, entretanto, viver feliz sem ele.

A internet aproxima as pessoas, é verdade, por que antes dela você jamais manteria tantos contatos em tantos lugares diferentes. Mas fotos e vídeos não substituem plenamente seus rostos e corpos, pois não posso cheirá-los, tocá-los nem olhá-los nos olhos. Você tem é que se satisfazer com a máquina. Quem não nos conhece, não nos ama.

Pode-se dizer, portanto, que, quanto mais internet, mais globalização e menos pessoalidade, menos amor. Claro que isso não conta para aqueles que não têm uma escolha melhor de manter contato, como quem mora longe. Vale mesmo para aqueles que têm a opção da pessoalidade e optam pela net.

Tomemos um exemplo nada básico (mas claro) de que a internet não agrega sentimentos: o de um velório virtual (sim, já aconteceu). Que valor há nisso?

Em suma: a internet aproxima ideologicamente as pessoas, mas as afasta pessoalmente.

Bem, e como vai haver muitas discordâncias, fica a seguinte questão: o que você gostaria de fazer se soubesse que morreria amanhã? Seria algo diferente da presença de pessoas?
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O véi Mané Sinhô


Fragmento da peça "A terrível peleja de Zé de Matos", de José Flávio Vieira, encenada pela Cia. Oca de Teatro.

Entra em cena, assombrado, o velho vaqueiro Mané Senhor, contando uma história complicada de que tinha visto um bicho enorme na serra do Araripe e que por pouco não o comeu.


Mané Senhor:

Me acuda seu Zé de Mato.
Eu tava na serra do Crato
caçando lá uns tatu,
Quesado, que Deus me deu!
Pois um bicho apareceu
e quase me come cru.


Um bêbado:

Temos aqui dois artistas.
São uns dois especialistas,
e vão fazer um favor.
Quesado e Zé de Mato,
que bicho foi que de fato
quase come o véi Senhor?


Luiz Quesado:

O véi Mane Sinhô
tava no mei do deserto,
dormindo de cu aberto,
chegou um bicho e entrou.
Saiu e depois voltou,
ficando nele encerrado.
Esse bicho era pelado,
chato, ocado e rombudo,
e tinha o pé cabeludo.


Zé de Matos:

O bicho não é de osso.
De carne também não é.
Não tem perna, mas tem pé.
Não tem braço e tem pescoço.
Ora está fino ora grosso.
Tem capa, mas anda nu.
Não tem rabo, ele é suru.
Carrega os ovos num saco.
Em falta de outro buraco,
ele se esconde no cu.


Luiz Quesado:

O bicho é feito de mola
e traja chapéu de couro.
Não come e vomita soro,
e tem a cabeça de sola.
Se alguém seu nome ignora,
diz o Braz italiano
que, passando em Pacatuba,
viu alguém por lá chamando
este bicho de Manjuba.


Zé de Matos:

Vomita o que não engole,
fica triste quando come.
Eu não sei dizer-lhe o nome,
mas disse a veia Chica,
se a capa for de pelica,
formado por natureza,
pode afirmar com certeza
que o nome do bicho é pica.
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Decomposição

Ferida aberta
expondo as entranhas.
E tão estranhas são as vísceras,
ardidas pelo vento que sopra,
inflamadas pelo sangue que pulsa,
doídas pelo desejo que clama,
enquanto o corpo se desfaz
numa cama.

Convulsas idéias de viver
no pretérito sem futuro.
A cabeça nos pés,
o coração no chão.
Uma infecção, um colapso,
inspiração, expiração
arrancado um pedaço.

Bem, não consegui encontrar o autor, mas com certeza ele se garante ;] Vi num blog legal: A vida em algumas linhas.
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Mother

Uma das melhores letras. De todas. Tradução.

Mother, do you think they'll drop the bomb?
Mother, do you think they'll like this song?
Mother, do you think they'll try to break my balls?
Mother, should I build the wall?

Mother, should I run for president?
Mother, should I trust the government?
Mother, will they put me in the firing line?
Is it just a waste of time?

Hush now baby, baby, don't you cry.
Momma's gonna make all of your nightmares come true.
Momma's gonna put all of her fears into you.
Momma's gonna keep you right here under her wing.
She won't let you fly, but she might let you sing.
Momma's will keep baby cozy and warm.

Oh, baby, (3x)
of course Momma's gonna help build the wall.

Mother, do you think she's good enough for me?
Mother, do you think she's dangerous to me?
Mother will she tear your little boy apart?
Mother, will she break my heart?

Hush now baby, baby, don't you cry.
Momma's gonna check out all your girlfriends for you.
Momma won't let anyone dirty get through.
Momma's gonna wait up until you get in.
Momma will always find out where you've been.
Momma's gonna keep baby healthy and clean.

Oh, baby, (3x)
you'll always be baby to me.

Mother, did it need to be so high?

Mother – Pink Floyd

Também acho uma das melhores de todas as músicas. Roger Waters cantando me dá arrepios.

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Sociologia dos bares

(Rubem Alves)

Acontece que o desejo de não estar sozinho bate de repente. A gente quer sair, mas não se atreve a visitar e é tarde para convidar. E foi nesse lugar de “desejar estar junto” que, me parece, aconteceu a metamorfose do bar, que de lugar de perdição acabou se tornando um lugar de comunhão. Os antigos não entendem. Minha sogra não o via com bons olhos – nem poderia ser diferente. Comparou o preço de uma cerveja do bar com o de uma do supermercado e não viu muita vantagem: “Não é muito mais econômico comprar a cerveja no supermercado e beber em casa?” Ela não sabia que bar não é lugar de beber. Lá a bebida é só desculpa para se estar junto. Do jeito mesmo como aconteceu no ritual eucarístico. Jesus não queria beber e comer. Ele queria estar junto, falar de amizade e saudade. E, para isso, valeu-se de pão e vinho.

Faz muito que a sociologia dos bares me fascina. Ela tem a ver com as várias relações entre as pessoas que acontecem dentro daquele espaço. Percebi que se parecem muito com as que acontecem em lugares sagrados. Há bares que se parecem com catedrais: são enormes, centenas de pessoas cabem lá dentro, as pessoas se perdem na multidão. Ir lá é como participar de uma romaria. Outros bares se parecem com pequenas capelas e mosteiros: as relações são íntimas, as pessoas se conhecem, os garçons são chamados pelo nome. Voltar a esse bar é voltar a um lugar já conhecido e amigo. Um freqüentador não é um cliente. Ele tem nome. Aí muitas coisas interessantes podem acontecer. Muita filosofia e muito amor nasceram em uma mesa de bar.

Não tem nada a ver com restaurante, onde raspado o prato vai-se embora. Barriga cheia, não há mais o que fazer. O tempo anda rápido. Nos bares é diferente: o tempo pára. Não se vai lá pensando em sair, mas em se desfazer dos objetivos do tempo.

Por vezes, o que se deseja é estar sozinho. Muito já entrei numa igreja, no meio do dia, só para estar só. Sozinho, num bar, lendo um livro, pensando. Isso, claro, se o bar não for do tipo igreja pentecostal, onde é proibido estar sozinho, pois o barulho é de tal ordem que a solidão é impossível. De uma boate conhecida se diz: “É muito romântica: todos falam com a boca colada no ouvido do outro”. Tem de ser assim, pois o barulho da música é tal que não se ouve o que a boca do outro diz.

É verdade que os bares já foram lugares de perdição. Eram, não onde as pessoas se perdiam, mas o lugar em que os que haviam se perdido em outros lugares vazios de alegria tentavam encontrar a alegria perdida.

Num tempo em que visitar caiu de moda, é bom saber que há um lugar onde é possível estar com os amigos.

(ALVES, Rubem. "Cenas da vida", São Paulo: Papirus, 1997. P.  89 à 90)
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O Grito


Passeava pela estrada com dois amigos, olhando o pôr-do-sol, quando o céu de repente se tornou vermelho como sangue. Parei, recostei-me na cerca, extremamente cansado - sobre o fiorde preto azulado e a cidade estendiam-se sangue e línguas de fogo. Meus amigos foram andando e eu fiquei, tremendo de medo - podia sentir um grito infinito atravessando a paisagem.

Em 1892, integrado à vanguarda intelectual de Berlim, Edvard Munch recebeu um convite para expor na cidade. Ele aceitou a proposta e preparou uma exposição com 50 quadros para a União dos Artistas local. A reação do público foi extremamente negativa. Os visitantes ficaram tão escandalizados com o que viram que a casa foi obrigada a cancelar o evento em menos de uma semana.

Em 2005, a historiadora da arte Sue Pridaux disse ter identificado a paisagem que inspirou Edvard Munch a pintar o seu quadro mais célebre, "O Grito". Segundo a pesquisadora, a paisagem que se vê no fundo da tela seria composta pelas montanhas de Kristiania, a atual Oslo, observadas de Ekeberg, onde ficava o hospital psiquiátrico em que a irmã mais nova do artista, Laura, teria ficado internada sob o diagnóstico de esquizofrenia. Perto do local, havia também um matadouro. Segundo a historiadora, os gritos dos animais na hora da morte, combinados com o dos loucos do asilo, é o que teriam motivado Munch a pintar o quadro.

Retirado de Coleção Folha Grandes Mestres da Pintura.
 
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